terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Satisfação


Minha maior felicidade nasceu no sábado e eu ainda não encontrei as palavras certas pra explicar essa sensação. Enquanto isso, justifico a minha ausência e prometo voltar a postar em breve.
Beijos para todos!

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Pra não me acusarem de ter abandonado o blog...



E chora tanto de prazer e de agonia
De algum dia, qualquer dia
Entender de ser feliz
De madrugada, essa mulher faz tanto estrago
Tira a roupa, faz a cama, vira a mesa, seca o bar
Ah, como essa louca se esquece
Quanto os homens enlouquece
Nessa boca, nesse chão
Depois, parece que acha graça
E agradece ao destino aquilo tudo
Que a faz tão infeliz
Essa menina, essa mulher, essa senhora
Em que esbarro toda hora
No espelho casual
É feita de sombra e tanta luz
De tanta lama e tanta cruz
Que acha tudo natural.
(Elis)

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

"It's something unpredictable,but in the end it's right..."

Eu sempre fui a favor do aborto. Agora, grávida de oito meses, posso dizer que nunca tive tanta certeza da minha posição. Eu imagino que seja chocante para muitas pessoas lerem isso, e os mais fervorosos provavelmente me chamarão de assassina, ainda que eu esteja carregando o maior amor do mundo dentro de mim.

É justamente por estar amando tanto esse monstrinho, sem ao menos tê-lo visto ao vivo, que eu defendo o aborto. Filhos devem vir ao mundo quando são muito desejados. Conheço histórias de pessoas que engravidaram acidentalmente e hoje são mães e pais espetaculares. Entretanto, conheço muito mais histórias de pessoas que não ficaram satisfeitas com a notícia... e não estão até hoje.

Ao contrário do que as românticas pensam, são nove meses terríveis de enjôos, dores nas costas, órgãos espremidos, privações, pernas inchadas, inteligência emocional zerada e riscos diários... que só são compensados pela alegria de sentir os chutinhos, de acompanhar o desenvolvimento do bebê, imaginar o rostinho, as mãozinhas, pezinhos... coisas que só uma mãe muito feliz com a gravidez vai sentir.

Com certeza o aborto é uma experiência horrível e é muito difícil engravidar hoje em dia, com tantos métodos preventivos. Mas acontece, e não adianta querer ameaçar os pais com aquelas frases estúpidas: “ Brincou de médico, agora vai ter que brincar de papai e mamãe”. Uma vez grávida, não tem volta. E para os que pensam que estão “castigando” os pais, possivelmente estão condenando uma criança a viver como um fardo.

Além disso, quantas meninas morrem por ano com abortos alternativos? São remédios que causam hemorragia, chás de coisas inimagináveis e até agulhas de crochê. Na melhor das hipóteses encontram um açougueiro disposto a fazer o aborto... e ele acaba tirando coisa demais lá de dentro. E de que adianta uma lei que diz que é crime, se qualquer um com um pouquinho mais de dinheiro faz com toda a segurança em qualquer clínica clandestina, com médicos de verdade?

Fazer um aborto depois dos três meses, realmente é sacanagem. O bebê já sente a mãe, os dois já estão ligados. Quando se faz antes disso, não acho que a mulher esteja matando alguém. Posso estar errada, e talvez nunca saibamos ao certo quando começa uma vida, mas pra mim é quando o feto passa a ter consciência de si, e não acredito que isso aconteça tão cedo, por mais bonitinho que possa parecer.

Um filho liga duas pessoas por bastante tempo. Um casal que não se gosta o suficiente ou que por algum motivo não pode ficar junto é obrigado a conviver durante anos, ligados por uma criança inesperada. Mais do que nunca, hoje eu vejo o quanto é importante ter do lado alguém que apóie a mãe, que deseje o bebê tanto quanto ela. Fico triste só de pensar nas mulheres que passam por tudo sozinhas, ou com uma presença masculina absolutamente dispensável, que faz questão de assim permanecer.

É idiotice pensar que a mulher não se importa, que fará quantas vezes forem necessárias. Por mais que existam mulheres bem frias e inconseqüentes, é muito difícil passar por esse processo sem ficar machucada, marcada. Algumas mais, outras menos. Eu sinto muita pena, e não raiva de quem precisa passar por isso, e realmente acredito, mesmo que pareça um pensamento infantil, que de uma forma ou de outra essa criança virá pra perto da mãe um dia, e ela poderá recebê-lo com todo o carinho que provavelmente não pôde oferecer antes.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Solução

Ela tinha sete anos, mas seu semblante aparentava os trinta anos de uma mulher infeliz. Chorava, limpava as lágrimas, chorava,limpava o nariz, chorava. A empregada, adolescente cearense recém chegada, a abraçava, menos para consolar a menina do que pra se acalmar. Mais uma vez ela assistia ao espancamento da mãe. O pai, transtornado, arremessava a cabeça da mulher contra a parede repetidamente. Ela caía, ele chutava. Ela suplicava pra que ele parasse, ele a ignorava com socos, tapas e o que mais lhe ocorresse.

A menina foi ver onde estavam os irmãos menores. As crianças brincavam com bonequinhos, sentados no chão. Olharam como se quisessem perguntar por que ela estava chorando. Fungou aliviada, eles não pareciam entender o que estava acontecendo, e isso a deixava feliz. Como era muito pequena, não conseguia alcançar a maçaneta da porta. Puxou até onde conseguia e deixou encostada. Passou pelo quarto dos pais com os ouvidos tapados, os gritos continuavam.

Quando o pai saiu de casa, automaticamente ela parou de chorar. Era sempre assim. Não foi ao quarto da mãe, não tinha a menor vontade de olhar os olhos roxos, as marcas enormes espalhadas pelo corpo, o choro contido, para não doerem os músculos. Foi sozinha para o quarto e deitou-se com os irmãos, que já dormiam profundamente. Cansada, apagou em menos de cinco minutos.

De madrugada, despertou. O pai parecia ter acabado de voltar. Ela abriu os olhos, mas permaneceu imóvel. Conforme os passos iam se aproximando, seu coração disparava, conseguia escutar o barulho forte dos batimentos. Ele recomeçaria? Fechou os olhos, fingindo dormir. O homem entrou no quarto das crianças, acendeu a luz e chamou a menina. Imediatamente ela levantou. “Vem pra sala, deixa os meninos dormirem”.

A voz que era tão doce, que exibia a filha aos amigos, que a levava à biblioteca, que ensinava os números romanos, a deixava apavorada naquele momento. Pensou na mãe, que não era carinhosa nunca, nem assustadora. Seguia o pai pela casa em silêncio, os olhos ardiam de sono, as pernas doíam. Ele ligou a televisão, era dia de corrida. Ayrton Senna estava na frente, ainda bem. O pai sorriu, elogiou o piloto, tirou um saquinho de chicletes coloridos e deu à menina.

Sentiu uma enorme vontade de chorar. Por quê o pai só era bonzinho assim com ela? O que a mãe fazia de tão errado? Aceitou o presente. “Não vai comer?”, perguntou, cobrando. “Eu já escovei o dente”. Silêncio. O cheiro de álcool e cigarro tomava conta do ar. A garota não se importava, gostava da mistura. Estavam os dois encostados em uma grande almofada em frente à televisão. A pouca mobília da sala deixava os telespectadores sem muitas opções. Incomodado, o pai afrouxou o cinto e tirou de dentro da calça a pistola.

Ela não se mostrou surpresa. Ele gostava de exibir a arma pra filha, já tinha passado algumas tardes ensinando a menina a atirar. Os dedos pequenos não conseguiam puxar o gatilho, e ele se irritava. “Garota idiota”. Não gostava quando ele atirava nos gatos do terreno ao lado da casa, mas não falava nada. Sentia culpa, não queria decepcionar o pai, queria menos ainda deixá-lo irritado. Quando ele cansava da brincadeira, a colocava no carro e levava pro lugar que fosse, como se ela fosse um homem da sua idade.

Ás vezes chegava de mau humor em casa, o que se notava pela batida da porta, e a menina sabia que seu inferno começaria. Atormentava a mulher com coisas do tipo "não fale comigo hoje, não quero ouvir sua voz". Em uma hora lá vinha a mãe perguntar se podia servir o jantar...e ele quebrava os pratos em sua cabeça.

Na sala, o pai parecia não prestar muita atenção na corrida. A cabeça pendia pro lado. Apoiava uma mão no chão e segurava a arma com a outra. A menina contemplou as mãos do pai por alguns minutos. A mãe costumava dizer que as dela seriam parecidas. Olhou para as próprias mãos. Eram maiores do que as das outras meninas, e ela sentia vergonha. O pai agora parecia dormir. Cuidadosamente ela foi tirando a arma do seu colo. Ele rosnou e voltou a dormir. A ação não durou muito tempo. Empunhou a pistola, apontou para a cabeça do pai e puxou o gatilho. Com o tiro, na cabeça, ele se mexeu pouco. Não sentiu morrer. A menina deitou-se no chão, ao lado do corpo, fechou os olhos. Uma paz imensa tomou conta do corpinho magro.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Hein?

O GLOBO: O senhor disse ser o mais importante intelectual brasileiro. Pode explicar esta declaração?


PAULO COELHO: Não preciso explicar por que eu disse isso. Falei o que achava que tinha que ser falado. Uma frase é uma frase: sujeito, predicado e verbo. Sou o intelectual mais importante do Brasil. ponto. Não precisa explicar.

Devaneios espirituais...

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Ponto de vista

- Se nos apaixonássemos, seria algo grandioso.
- Por quê?
- Porque as pessoas egoístas, de certo modo, são incrivelmente capazes de grandes amores.

Este lado do paraíso, F. Scott Fitzgerald

Grandes amores.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

E se você ficasse dessa vez?



Você ainda não viu? Veja urgente. Viu e não gostou muito? Veja de novo agora.
Esse é o filme que eu gostaria de ter feito. Pensei em escrever alguma coisa sobre ele, mas isso requer muita inspiração. Enquanto isso, deixo pra vocês um pedacinho do que surpreendentemente foi a história de amor mais bonita que eu já vi nos últimos tempos...(e faz bastante tempo que eu assisti da primeira vez).
Enjoy!

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Too late...

"She looks like the real thing
She tastes like the real thing
My fake plastic love
But I can't help the feeling
I could blow through the ceiling
If I just turn and run"


Radiohead

Isabel passou a vida toda apaixonada pelo mesmo homem. Não que não tenha tido outras paixões ao longo da vida, mas essa foi a única que nunca acabou. Talvez não tenha acabado justamente porque não foi até o fim, não deu pra sugar até a última gota de amor, como acontece com os namoros e casamentos.

Eles nunca namoraram, na verdade. Não teoricamente. Tiveram um caso que começou quando ela tinha seus dezoito anos, e que nunca acabou. Casaram com outras pessoas, tiveram filhos. Isabel carregava aquele amor como quem guarda uma foto da avó na carteira ou um pingente que usou na adolescência. Aquela coisa boa de olhar, de lembrar. Quando tudo parecia estar dando errado colocava uma das músicas que lembravam algum momento dos dois, passava o perfume dele. Não precisava de drogas, a vida voltava ao normal, sentia-se mais feliz.

Nunca doeu. Falavam-se quase sempre, conversavam trivialidades, você leu isso, como anda o trabalho, alguma novidade, faziam umas gracinhas, se refugiavam nas ironias bobas. Às vezes a saudade esquecia os limites e ela fazia uma visita. Nunca deixou de ser um grande acontecimento olhar naqueles olhos, ouvir a gargalhada tímida, querer acreditar na alegria que ele sentia ao vê-la. Sentavam, conversavam, riam abobalhados, mas sempre parecia que alguém estava prestes a explodir. Isabel só conseguia pensar em beijar o rosto, a boca, as mãos. Queria tocar o corpo dele, seria capaz de passar o dia inteiro deitada olhando e tocando cada detalhe que ela conhecia tão bem.

Sua maior frustração não era a de nunca ter conseguido virar nada oficial: namorada, noiva, mulher... a maior frustração era a de nunca ter conseguido ter certeza do que ele sentia. Ela gostava de sentir aquela emoção toda, aquele amor profundo, que era até egoísta. Isabel adorava saber que longe de tudo, indiferente a qualquer pedaço de sua vida, aquele amor estaria sempre lá enquanto ela quisesse.


Faltava só a certeza de que em algum momento ele amou também. Em algum momento ele sentiu sua falta, ele quis beijá-la mesmo sabendo que não havia a menor possibilidade disso acontecer. Nunca cogitou a possibilidade de casarem, por exemplo. Na verdade ela era bem feliz em seu casamento. O bom de tudo isso era saber que o homem que ela tanto amava estaria pra sempre na quarta dimensão.

Contudo, restava a dúvida. Tinha medo de morrer sem jamais saber o que significavam pra ele todos aqueles anos. Queria ao menos receber uma carta, um texto, um poema, algo escrito por ele sobre ela. Disso ele sabia, mas nunca escreveu.

Um dia, Isabel esqueceu. Bastou acordar um dia e inventar que não havia retribuição, que não havia sentido. Chorou por cada ano, cada culpa que sentiu, cada mentira que contou, cada ilusão, sonho, amaldiçoou sua imaginação. Esqueceu.

Passaram-se meses e um dia se encontraram no sinal. Moravam e trabalhavam no mesmo bairro, mas nunca haviam se encontrado. Olharam-se. Isabel sorriu. Os olhos dele se encheram. Eu amo você. Os olhos dela se fecharam. O sinal abriu. Nunca mais se falaram.

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Pequenas Epifanias

Há alguns dias, Deus – ou isso que chamamos assim, tão descuidadamente, de Deus –, enviou-me certo presente ambíguo: uma possibilidade de amor. Ou disso que chamamos, também com descuido e alguma pressa, de amor. E você sabe a que me refiro.Antes que pudesse me assustar e, depois do susto, hesitar entre ir ou não ir, querer ou não querer – eu já estava lá dentro. E estar dentro daquilo era bom. Não me entenda mal – não aconteceu qualquer intimidade dessas que você certamente imagina. Na verdade, não aconteceu quase nada. Dois ou três almoços, uns silêncios. Fragmentos disso que chamamos, com aquele mesmo descuido, de “minha vida”. Outros fragmentos, daquela “outra vida”. De repente cruzadas ali, por puro mistério, sobre as toalhas brancas e os copos de vinho ou água, entre casquinhas de pão e cinzeiros cheios que os garçons rapidamente esvaziavam para que nos sentíssemos limpos. E nos sentíamos.

Por trás do que acontecia, eu redescobria magias sem susto algum. E de repente me sentia protegido, você sabe como: a vida toda, esses pedacinhos desconexos, se armavam de outro jeito, fazendo sentido. Nada de mal me aconteceria, tinha certeza, enquanto estivesse dentro do campo magnético daquela outra pessoa. Os olhos da outra pessoa me olhavam e me reconheciam como outra pessoa, e suavemente faziam perguntas, investigavam terrenos: ah você não come açúcar, ah você não bebe uísque, ah você é do signo de Libra. Traçando esboços, os dois. Tateando traços difusos, vagas promessas.Nunca mais sair do centro daquele espaço para as duras ruas anônimas. Nunca mais sair daquele colo quente que é ter uma face para outra pessoa que também tem uma face para você, no meio da tralha desimportante e sem rosto de cada dia atravancando o coração. Mas no quarto, quinto dia, um trecho obsessivo do conto de Clarice Lispector – Tentação – na cabeça estonteada de encanto: “Mas ambos estavam comprometidos. Ele, com sua natureza aprisionada. Ela, com sua infância impossível”. Cito de memória, não sei se correto. Fala no encontro de uma menina ruiva, sentada num degrau às três da tarde, com um cão basset também ruivo, que passa acorrentado. Ele pára. Os dois se olham. Cintilam, prometidos. A dona o puxa. Ele se vai. E nada acontece.

De mais a mais, eu não queria. Seria preciso forjar climas, insinuar convites, servir vinhos, acender velas, fazer caras. Para talvez ouvir não. A não ser que soprasse tanto vento que velejasse por si. Não velejou. Além disso, sem perceber, eu estava dentro da aprendizagem solitária do não-pedir. Só compreendi dias depois, quando um amigo me falou – descuidado, também – em pequenas epifanias. Miudinhas, quase pífias revelações de Deus feito jóias encravadas no dia-a-dia.Era isso – aquela outra vida, inesperadamente misturada à minha, olhando a minha opaca vida com os mesmos olhos atentos com que eu a olhava: uma pequena epifania. Em seguida vieram o tempo, a distância, a poeira soprando. Mas eu trouxe de lá a memória de qualquer coisa macia que tem me alimentado nestes dias seguintes de ausência e fome. Sobretudo à noite, aos domingos. Recuperei um jeito de fumar olhando para trás das janelas, vendo o que ninguém veria.Atrás das janelas, retomo esse momento de mel e sangue que Deus colocou tão rápido, e com tanta delicadeza, frente aos meus olhos há tanto tempo incapazes de ver: uma possibilidade de amor. Curvo a cabeça, agradecido. E se estendo a mão, no meio da poeira de dentro de mim, posso tocar também em outra coisa. Essa pequena epifania. Com corpo e face. Que reponho devagar, traço a traço, quando estou só e tenho medo. Sorrio, então. E quase paro de sentir fome.

Caio Fernando Abreu ( O Estado de São Paulo, 22/04/86)

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Canção

Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
- depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar

Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre de meus dedos
colore as areias desertas.

O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo meu sonho,
dentro de um navio...

Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.

Depois, tudo estará perfeito;
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.

Cecília Meireles