terça-feira, 23 de junho de 2009

Do outro lado da mesa.

Este texto está sujeito a alterações. Quero aproveitar essa fase de inspiração e resolvi postar logo. Sugestões?

Adoraria estar longe dali. Tentava se concentrar na conversa, mas quanto mais tentava, mais entediantes pareciam ficar aqueles homens, parecia que não tinham mais nada a dizer, e por isso falavam sem parar sobre aquele conhecimento inútil, adquirido em tantas outras reuniões como aquela, que só de imaginar lhe causavam arrepios.

Sabia que não sairia tão cedo, afinal a irmã, que a convidara, parecia estar bastante entretida. Começou a pensar em maneiras de diversão. Passou rapidamente o olhar pela mesa e encontrou um que lhe desconcertou. Ele a encarava de um jeito tão intenso que ela chegou a pensar que era só um olhar perdido, mas logo mudou de idéia quando percebeu que ele não desviara. Ele não era muito atraente, não era bonito nem feio,não era charmoso, mas lhe despertou interesse, principalmente quando lembrou que ele tinha sido o único que não tinha tentado puxar conversa a noite toda.

Quando pensou nisso, sentiu uma leve ferida em seu orgulho. Ela era sempre desejada, a que os homens se desdobravam para receber aquela atenção indiferente, que ela fazia questão de aprimorar a cada nova investida masculina. Sempre tinha sido assim, talvez por isso tivesse tão poucas amigas. Sentia falta disso, mas nunca admitia; preferia dizer que as mulheres eram muito competitivas e inseguras, e que por isso, preferia a companhia vazia dos homens.

Nunca tinha se apaixonado e disso não sentia falta mesmo. Os homens, na verdade, não lhe interessavam. Desde a época do colégio olhava com desprezo para todas as meninas que sonhavam com o homem ideal e fazia questão de demonstrar, fazendo graça de todas as histórias que contavam. Assim, aos poucos, começou a ser excluída de todos os grupinhos risonhos e escandalosos de meninas descontroladas.

Na verdade, ela era apaixonada por si mesma. Era um amor tão grande, que não tinha espaço mesmo para mais ninguém. Sentia-se extremamente bonita e fazia questão de cuidar de cada parte do seu corpo para que essa sensação durasse mais alguns anos. Não fazia questão de ser inteligente, mas procurava se informar para nunca ser motivo de chacota. Apesar de tudo, sabia que a mulher burra perde a graça, e ela nunca perdia a graça.

Aquela noite parecia começar a ficar mais interessante, o ser esquisito continuava a observá-la e não dizia nada.Resolveu investir; mais um na sua lista de apaixonados que se tornavam patéticos em quesão de dias. Ela começou a mexer nos cabelos: afrouxou o coque, deixando fios curtos e negros espalhados pelo pescoço e ombros. Quando o anfitrião serviu-lhe mais uma taça, agradeceu com um sorriso largo e olhou novamente para o homem à sua frente. Ele não olhava mais. Quem era esse idiota que não olhava justamente quando ela começou a querer chamar sua atenção? Começou a pensar em alguma maneira de chamá-lo de volta, mas estava tão desconcertada com a sua própria patetice que não conseguia.

Levantou o olhar e ele a encarava novamente. Decidiu que era hora de agir; ouviu quando o que parecia ser o amigo mais próximo fez uma pergunta sobre a safra do vinho. Ele deu de ombros e ela prontamente respondeu, complementando com a origem e falando sobre uma viagem que tinha feito, onde o provou pela primeira vez. O amigo, surpreso com a súbita animação daquela que – esperançoso em sua embriaguez – ele acreditava que poderia terminar a noite em sua cama, ouviu com toda a atenção o relato da mulher.

Enquanto isso, os grandes olhos verdes e expressivos a encaravam novamente, dessa vez com a testa franzida e a expressão de desdém que – pensou - ela deveria estar fazendo. Impunemente, deu uma leve risada e desviou o olhar, iniciando uma conversa com a menina que tinha acabado de chegar; diziam que era a sobrinha do dono da casa.

Estava atordoada. Mal conseguiu recuperar o fôlego e percebeu que sua história nada tinha a ver com o que o amigo tinha perguntado. Tinha feito papel de idiota mais uma vez e estava começando a suar frio, nunca tinha se sentido assim. Num último gesto de desespero e pavor pela proximidade da primeira derrota, tentou iniciar um assunto qualquer; reclinou o corpo para frente e, olhando só para ele, comentou como seria bom estar em outro lugar,mais animado. Ele olhou de novo com a mesma cara da primeira vez e respondeu o “não” mais gelado que podia e virou-se de volta para a garota sorridente ao lado.

Completamente fora de si, derrubou a taça e caiu em prantos. Ele levantou, caminhou até ela, levantou sua cabeça, olhou em seus olhos escuros e envergonhados. Sorriu com carinho, ignorando o resto da mesa, que olhava incrédulo para a cena. Pegou-a pela mão e saíram sem se despedir.

5 comentários:

FERNANDO disse...

Um conto gostoso, aconchegante e sedutor. A essência das relações entre homem e mulher. O flerte. A inexplicável atração química entre dois corpos específicos. Gostei.

Rafa disse...

Ótimooo, me senti vendo tudo! Antonia, escreve um livro!!!

Beijinhos

Giulliano disse...

Sensacional!

Carolina disse...

Adorei. Concordo muito com a Rafa, escreve logo um livro amiga! Beijocas.

Caio Augusto Mourão disse...

Primeira vez que visito o blog e gostei muito da parte dos contos, que parece predominar aqui. Continue escrevendo, pois o seu talento é único e é maravilhoso apreciá-lo.
Parabéns.